terça-feira, 18 de setembro de 2007

Como nossos pais

Todo-o-Mundo: meu tempo todo enteiro sempre é buscar dinheiro.
Ninguém: Eu hei nome Ninguém, e busco a conciência.
Dinato: Que escreverei companheiro?
Berzabu: Que Ninguém busca conciência, e Todo-Mundo dinheiro.
Todo-o-Mundo: busco honra muito grande.
Ninguém: Eu, virtude, que Deus mande que tope co'ela já.
Berzabu: Outra adição nos acude: que busca honra Todo-Mundo, e Ninguém busca virtude.
Todo-o-Mundo: Busco mais quem me louvasse tudo quanto eu fezesse.
Ninguém: E eu quem me reprendesse em cada cousa que errasse.
Dinato: Que tens sabido?
Berzabu: Que quer em estremo grado Todo-Mundo ser louvado e Ninguém ser reprendido.
Todo-o-Mundo: Folgo muito d'enganar e mentir naceu comigo.
Ninguém: Eu sempre verdade digo, sem nunca me desviar.
Berzabu: Ora escreve lá, compadre, não sejas tu preguiçoso.
Dinato: Que?
Berzabu: Que Todo-Mundo é mentiroso, e Ninguém diz a verdade.

Fragmentos do Auto da Lusitânia, de Gil Vicente (1465/1537, aproximadamente)

Nenhum comentário:

Postar um comentário